Artigo
A internet fecha suas fronteiras
Nº edição: 675 | 10.SET - 21:00 | Atualizado em 10.09 - 22:06
Governos e empresas privadas estão criando muros que ameaçam a liberdade e a universalidade da web
por Ralphe Manzoni Jr.
Em abril de 2009, os fundadores da BitTorrent, mais famosa rede de troca de arquivos da internet, foram sentenciados a passar um ano na cadeia por violação de direitos autorais e a pagar uma multa de US$ 3,59 milhões pela Justiça sueca.
Na época, Peter Sunde, um dos criadores do site, brincou. “Don’t worry – we’re from the internets. It’s going to be alright” (Não se preocupe, somos das internets. Tudo vai ficar o.k.), escreveu.
A mensagem hoje é quase um sinal de clarividência. A internet, que é considerada a rede das redes, está se dividindo em várias fronteiras digitais diferentes, o que ameaça dois de seus princípios fundamentais: a liberdade e a universalidade.
As ameaças surgem de três frentes. A primeira é política. A China com o seu “Grande Firewall”, muralha tecnológica que impede os chineses de acessarem alguns sites e que filtra conteúdos considerados impróprios, impõe uma barreira ao livre acesso.
Quando visitei o país, em abril, tentei navegar pelo Twitter, Facebook e YouTube. A resposta que recebia era de sites inexistentes, sem nenhum aviso prévio da censura a esses conteúdos. Para os chineses, eles simplesmente foram riscados do mapa. Outros países como Irã, Cuba, Arábia Saudita e Vietnã também têm algum controle sobre a rede.
Mas não são apenas os governos que fecham o cerco à internet. As empresas de telefonia, que operam as redes por onde os dados da internet circulam, ameaçam criar rodovias privilegiadas para aqueles provedores de conteúdos que pagarem por isso.
Imagine você tentando acessar o site de vídeos YouTube. Para chegar até ele, há dois caminhos. Um congestionado, no qual você demorará horas para atingir o seu destino. E outro livre, sem carros, mas com um pedágio no trajeto.
Essa polêmica, que ganhou o nome de “neutralidade da internet”, é uma ameaça real nos Estados Unidos. O debate não demorará a chegar ao Brasil. Por fim, há as próprias empresas de internet, que estão construindo o que a revista britânica The Economist chamou de “jardins murados”. A Wired, uma das revistas mais influentes sobre cultura digital do mundo, cunhou o termo “economia dos aplicativos” e decretou o fim da web da forma como a conhecemos.
Observem o exemplo da Apple. Com o iPhone e o iPad, ela controla severamente o desenvolvimento dos programas que vão rodar em seus aparelhos. Não é mais preciso um browser para navegar pela internet. Tudo está dentro dos jardins de Steve Jobs. Até mesmo a rede social Facebook desenvolveu um programa interno de e-mail para os seus mais de 500 milhões de usuários cadastrados.
Em seu primeiro boom, há 15 anos, a internet foi considerada uma rodovia digital capaz de eliminar fronteiras, encurtar distâncias e facilitar e democratizar a transferência de informação e conhecimento. Atualmente, há quase dois bilhões de pessoas acessando a web no mundo, o que significa um em cada três habitantes da Terra.
À medida que foi crescendo em importância, essa versão romântica e utópica da internet foi morrendo. Governos, empresas e companhias telefônicas querem cada vez mais controle sobre ela e estão criando não uma, mas várias internets. A web perde não só sua liberdade, mas, principalmente, o seu caráter universal.
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