domingo, 31 de janeiro de 2010

Ver a pobreza mas cair fora... revista Veja

 
A reportagem da VEJA nos traz uma reflexão da divisão de classe entre os países... confira...
Turismo

Marcelo Bortoloti

Agências especializadas oferecem roteiros por favelas e regiões
devastadas a turistas que querem ser diferentes dos outros turistas

ÁFRICA DO SUL
Turistas em meio ao lixo: 300 000 visitantes a cada ano

 
A imagem foi feita nos Cape Flats, um conglomerado de favelas na Cidade do Cabo, na África do Sul. Em meio a montes de lixo, turistas fotografam as condições miseráveis em que vivem 4 milhões de pessoas. Os Cape Flats são o principal destino do mundo dos reality tours, modalidade de turismo que põe viajantes estrangeiros em contato com pobreza e sofrimento. Por ano, recebem a visita de 300 000 pessoas – quase a metade do contingente que se desloca para Bariloche, a mais famosa estação de esqui da Argentina. No Brasil, o exemplo mais conhecido é a favela da Rocinha, que atrai por ano 42 000 turistas de outros países. Esse tipo de programa é o tema de Gringo na Laje – Produção, Circulação e Consumo da Favela Turística, no qual a socióloga Bianca Freire-Medeiros, da Fundação Getulio Vargas, analisa a atração exercida pela miséria em certos círculos.
Na Inglaterra do século XIX não era considerado impróprio aos moradores abastados de Londres, de vez em quando, praticar o slumming, a visita aos bairros pobres (slums) por curiosidade ou em busca de aventura e de experiências excitantes para o paladar e os olhos. Em troca, deixavam-se alguns trocados para os moradores. O pico de prosperidade material nos Estados Unidos depois da II Guerra Mundial reduziu a pobreza extrema aos guetos de minorias raciais. Uma vez vencida, a miséria pode ser até cultuada como fonte de "pureza" e de inspiração. Esse conceito seria impensável na geração anterior, a da Grande Depressão, em que a pobreza foi sinônimo de degradação física e moral, situação em torno da qual se desenvolve o famoso romance Tobacco Road, de Erskine Caldwell. O livro virou filme e peça de teatro, mas não inspirou ninguém a visitar os barracos dos brancos bocas-sujas, beberrões e estupradores. 

FILÃO RENTÁVEL
Sete agências oferecem passeios pela Rocinha

Ainda hoje, os visitantes prósperos são atraídos às favelas como um remédio para o tédio burguês, pela ideia da pobreza como purgadora e, claro, pela certeza de que eles próprios nunca vão morar naqueles casebres. Filmes como Cidade de Deus aumentaram o número de visitantes à favela da Rocinha, no Rio de Janeiro. O sucesso do longa Quem Quer Ser um Milionário? teve o mesmo efeito na Índia. Outros destinos procurados são os cenários de dramas humanos de repercussão internacional, como é o caso agora das áreas mais atingidas pelo furacão Katrina, que, em 2005, quase destruiu Nova Orleans.